Por Rodrigo Soares*
Muito prazeroso, o surf também é inegavelmente um dos esportes mais difíceis do mundo. São muitas variáveis incontroláveis e riscos a gerenciar, lidando sempre com a imprevisibilidade constante da natureza. A cada sessão de surf, o mar é sempre diferente, e a única certeza é a de que o surfista precisa saber lidar com esse meio mutante que possui força muito superior à sua.
Atualmente, o surf é um dos esportes mais praticados do mar e um dos mais bem pagos aos seus campeões. Mas, nem sempre foi assim. Para conseguir meu primeiro emprego em uma grande empresa, precisei esconder que era surfista!
Há quase quatro décadas pegando onda e, boa parte desse tempo, atuando também como profissional, investidor e empreendedor, eu teria os argumentos necessários para mostrar ao meu primeiro contratante que um surfista tem qualidades muito úteis e interessantes, que a imagem do surfista alienado e desocupado era algo cultural à época, e que as qualidades de um bom surfista podem ser muito bem aproveitadas também no campo profissional, do empreendedorismo e da vida pessoal.
Listo abaixo pelo menos oito grandes lições que aprendi surfando e que valem ser compartilhadas com jovens profissionais e empreendedores:
1) Motivação para aprender
O aprendiz de surfista aprende, antes de tudo, observando o mar e o movimento dos outros surfistas. Pode ou não contar com a ajuda de treinamento orientado por professores, apesar de essa ser uma forma de reduzir o risco de acidentes e acelerar o seu aprendizado. Os pré-requisitos, na verdade, são poucos: saber nadar no mar e entre as ondas, ter um mínimo de preparo físico, muita motivação e determinação para aprender. Porém, da teoria à prática, chega a hora de se molhar e enfrentar as primeiras ondas – de preferência, bem pequenas, experimentando por conta própria os movimentos que observou e aprendeu no seco. Também é fundamental cair e tentar de novo, repetidas vezes, para encontrar o seu ponto de equilíbrio.
Para surfar qualquer onda é preciso se comprometer com ela, remar com força e determinação. A partir de um determinado ponto da remada não é mais possível voltar atrás. Se recuar, o caldo é certo. Por isso, é necessário acreditar e confiar em todo o seu potencial. E se, eventualmente, você falhar, basta se recuperar e usar de aprendizado para a próxima onda.
Até começar a surfar bem será um processo bastante longo e duro, uma curva de aprendizagem que requer muita determinação e é diferente para cada pessoa. Muitos desistem nessa fase ao descobrir que não era bem como imaginavam. Aos que perseveram na dificuldade, a garantia é de muito retorno em prazer e qualidade de vida.
Para surfar qualquer onda é preciso se comprometer com ela, remar com força e determinação
2) Planejamento e adaptabilidade
Uma sessão de surf precisa ser planejada com antecedência, pois o mar e suas ondas são de previsibilidade bem complexa. Por meio da meteorologia é possível prever por alguns dias a direção e a velocidade do vento; a direção, a força, o intervalo e o tamanho das ondulações; o movimento das marés; e a temperatura da água. No entanto, esse grande conjunto de variáveis em uma combinação minimamente adequada ainda precisa encontrar um bom terreno perto da orla, o fundo de areia que muda constantemente ou a formação adequada da bancada fixa de coral ou rochas que permitirão a formação “surfável” das ondas.
Pela previsão o surfista irá escolher onde surfar, e o mais avançado precisará ainda escolher o equipamento para o tipo de onda que planejou surfar, o tamanho e o formato da prancha, o padrão de quilhas, a cordinha e até mesmo o tipo de roupa que usará. Porém, mesmo com todos esses fatores bem previstos e o planejamento para a sessão de surf, quase sempre as ondas nunca estarão exatamente como esperadas. Dessa forma, costumo dizer que todo surfista acaba se tornando muito tolerante à frustração, pois na maioria das vezes a sua expectativa pelas previsões será frustrada e, sem desmotivar, terá de usar sua habilidade, os recursos que preparou e, às vezes, a criatividade para enfrentar as condições que encontrará a cada dia de mar.
3) Treinamento constante
Justamente por conta da grande variação de condições que os surfistas encontram, é importante treinar em todas elas, principalmente no começo. Nem sempre serão condições prazerosas, mas esse treinamento constante é o que permitirá que nas melhores condições o surfista esteja preparado para aproveitar ao máximo e ter o seu maior prazer como retorno pela sua dedicação.
Assistir vídeos de competições e outros surfistas, aprimorar o condicionamento físico fora do mar, desenvolver sua aquacidade, além de estudar sobre condições meteorológicas básicas e segurança no mar, são algumas das formas de aprendizado constante.
4) Habilidade social e concorrência
Em uma sessão de surf, na maioria das vezes, encontramos vários outros surfistas no mesmo local. Em alguns casos haverá muito mais surfistas do que ondas para todos. Existem regras de boa convivência e preferência que precisam ser respeitadas, “leis” não escritas que permitem que todos possam surfar com as mesmas condições. Em algumas praias, os surfistas locais irão reivindicar a prioridade e vão acrescentar suas próprias regras, eventualmente irão até expulsar os “haoles” (surfistas de fora). Então, o segredo é ter boa habilidade social, respeitar as regras comuns e do local onde vai surfar, e, principalmente, saber se posicionar no melhor ponto onde terá mais chances de conseguir boas ondas, disputando dentro das regras.
5) Autoconfiança e coragem para assumir riscos
Mar calmo não faz bom marinheiro. A famosa frase sugere que todos devem buscar por condições que desafiem suas habilidades para evoluir. E os surfistas estão sempre buscando por novos desafios, o que muitas vezes significa surfarem em condições cada vez mais difíceis, – nas quais, mesmo com todo preparo, frequentemente se veem em situações complicadas. Nesses momentos, é preciso ter a experiência necessária para lidar com a situação. Cair da prancha; ser atropelado por uma sequência de ondas; permanecer embaixo d’água por muito tempo; sofrer algum impacto no fundo, em sua própria prancha ou de outro surfista; ser acometido por cãibras; ser levado por uma forte corrente; e, por vezes, algumas dessas situações ao mesmo tempo. São inúmeras as possibilidades de acidentes que o colocam em dificuldade repentina.
O surfista experiente reconhece seus limites, sabe se proteger e, quando necessário, mesmo lidando com tantas dificuldades ao mesmo tempo, consegue manter o controle emocional com autoconfiança e atitude positiva. Assim, sem “congelar” ou se afobar, sabe usar seus conhecimentos para buscar a melhor saída da situação, sozinho ou reconhecendo quando precisa de ajuda. Se algum dano for inevitável, a meta é buscar o menor dano possível.
6) Foco e percepção de mudanças
Durante uma longa sessão de surf, que pode durar várias horas, o mar pode começar a mudar rapidamente ou lentamente. É preciso estar sempre atento às ondas e a essas mudanças de cenário. O vento pode mudar, as ondas podem ganhar força e tamanho, as correntes podem se intensificar, a maré pode subir e dificultar a sua saída do mar, nuvens de tempestade podem se formar ou até mesmo surgir alguma fauna marinha que coloque você em risco. Em momentos assim, será preciso decidir continuar, parar ou mudar de recursos para seguir surfando. Toda atenção é pouca.
7) Paciência e perseverança
Há momentos em que o surfista assistirá a outros aproveitando as melhores ondas, o que pode ser uma situação bastante angustiante e até irritante enquanto ele não consegue a sua. Pior ainda é conseguir uma boa onda, cair ou não conseguir surfar bem.
Não é raro querer desistir e encerrar a sessão, mas com experiência e perseverança será mais fácil lidar com situações assim. É preciso trabalhar a paciência e, aos poucos, posicionar-se melhor ou até mesmo buscar um outro local para surfar antes de desistir.
Vale pensar que nem todos os dias estamos bem. Outras vezes, é só uma questão de sorte. Nem sempre será questão de habilidade ou experiência, e a qualquer momento a sua sorte pode mudar. Esteja relaxado para aproveitar, lembrando que dias bons compensarão os ruins.
8) Consciência ambiental
Por ser um esporte praticado diretamente na natureza, no elemento marinho, com a influência dos elementos ar e terra, os surfistas desenvolvem naturalmente forte consciência ambiental. As ações humanas que impactam a natureza preocupam o verdadeiro surfista. O surfista de alma.
Para mim, os aprendizados com o surf e as analogias com situações do dia a dia continuam sendo essenciais para enfrentar dificuldades e aproveitar os bons momentos entre calmarias e tempestades.
E assim, continuo surfando as ondas da vida.
Aloha!
* Rodrigo Soares é graduado pela Universidade Santa Úrsula e pós-graduado em Marketing pela ESPM, começou sua carreira como auditor interno nas Lojas Americanas e se desenvolveu no setor financeiro. Além de membro do Conselho Diretor da JA Rio de Janeiro, é empreendedor, gestor de investimentos e consultor em gestão na Linked Empreendimentos. Entusiasta da web 3.0 e do metaverso, surfista, triatleta e praticante de esportes outdoor e de aventura.
Eu ja sabia amigo Rodrigo!
O Rodrigo Soares aborda muito bom o tema e confesso que sempre explorei os ensinamentos oriundos do surfe em minha vida pessoal e profissional. Minhas palestras sobre Gestão sempre incluem alguma abordagem relacionado a este esporte incrível.
Vivi ate um passado relativamente recente, similar necessidade de ter que esconder o fato de ser surfista em decorrência dos preconceito que existiam a respeito deste esporte ou do seu estilo de vida.
Hoje aos 56 anos grito ao 4 cantos que sou surfista e o que é ainda melhor a receptividade é ótima!
O Love surf!
Parabéns pelo testo Rodrigo!
PS : texto corrigido, pois havia erros no anterior.
Eu ja sabia amigo Rodrigo!
O Rodrigo Soares aborda muito bom o tema e confesso que sempre explorei os ensinamentos oriundos do surfe em minha vida pessoal e profissional. Minhas palestras sobre Gestão sempre incluem alguma abordagem relacionado a este esporte incrível.
Vivi ate um passado relativamente recente, similar necessidade de ter que esconder o fato de ser surfista em decorrência dos preconceitos que existiam a respeito deste esporte ou do seu estilo de vida.
Hoje aos 56 anos grito ao 4 cantos que sou surfista e o que é ainda melhor a receptividade é ótima!
O Love surf!
Parabéns pelo texto Rodrigo!